Este é um pequeno trecho da história de Jacó, o terceiro patriarca da Bíblia. O trecho do Genesis descreve a situação em que se encontrava Jacó após ter enganado seu irmão Esaú na partilha da herança de seu pai. O Jacó, o trapaceiro, jurado de morte pelo seu irmão, busca abrigo em um
lugar desconhecido e assustador. Na sua agonia, entre dúvidas e temores, Jacó tem um sonho. Sonha que com a possibilidade de haver um caminho onde possa achar segurança e paz. E é disso que a Bíblia fala o tempo todo. De gente como nós que engana, que se engana e que é enganada. Gente que está sempre fugindo dos perigos e ameaças em busca de um lugar de paz. É desse caminho que trata esta meditação.
lugar desconhecido e assustador. Na sua agonia, entre dúvidas e temores, Jacó tem um sonho. Sonha que com a possibilidade de haver um caminho onde possa achar segurança e paz. E é disso que a Bíblia fala o tempo todo. De gente como nós que engana, que se engana e que é enganada. Gente que está sempre fugindo dos perigos e ameaças em busca de um lugar de paz. É desse caminho que trata esta meditação.
Primeiramente gostaria de destacar que Jacó viveu na Idade do Bronze. Se quisermos estabelecer um paralelo, ele é contemporâneo de Conan, o bárbaro. Assim como Conan, Jacó era de origem sumeriana. Um povo extremamente supersticioso, que vivia assombrado por deuses e demônios. Povo de homens e mulheres que praticavam cultos estranhos, faziam oferendas sinistras e realizavam sacrifícios penosos. Tudo isso com a intenção de afastar seus temores, garantir proteção, e, quem sabe, aproximar-se dos seus deuses. Em meio a tudo isso, Jacó sonha com uma escada que o leva diretamente ao trono de Deus. A palavra que foi traduzida por escada tem o significado de rampa ou ladeira, mas quer configurar o acesso a um lugar elevado.
Enquanto os seus vizinhos sacrificavam as coisas que lhes eram caras, não por poucas vezes os próprios filhos queimando-os em altares, ou seja, fazendo o inimaginável para chegarem mais perto dos seus deuses que estavam distantes e lhes tratavam com indiferença, Jacó sonha com um Deus diferente. Jacó sonha com um Deus que vai ao encontro do homem, que cria possibilidades de acesso sem perdas nem sacrifícios. Ele sonha com um caminho suave e agradável que o levaria diretamente a Deus, onde poderia contar seus medos, expor suas ansiedades, minimizar suas dúvidas ao senti-lo de perto.
Eu fico pensando na quantidade de pessoas que ainda são vizinhas de Jacó. Que ficam queimando, sacrificando, abrindo mão das coisas que lhes são caras, que fazem rituais mirabolantes na tentativa desesperada de encontrar Deus. Muita embora a fé cristã não pregue o apego aos bens materiais, ela diz que se tivermos que perder alguma coisa, que seja por algo que valha a pena. Tem um trecho de uma poesia de Vinicius que traduz bem esse sentido da fé: e se perdendo, ser-lhe doce perder. Mas as perdas que estamos acostumados a ver não são nada doces, são, na verdade, terrivelmente amargas. E o que é pior, conduzem a perdas maiores e mais amargas ainda. Conduzem à superstição, ao medo, à ignorância, à escravidão e ao ridículo.
É para essas pessoas Jacó está dizendo que existe um caminho, e o caminho sonhado por Jacó, vai tornar-se realidade na figura de Jesus, que chama para si o encargo de tornar-se esse caminho: eu sou o caminho, a verdade e a vida, ninguém vai a Deus senão por mim. Aquele caminho que um dia Jacó sonhou está disponível: O caminho suave e agradável, o caminho lança fora o medo, a superstição e liberta de qualquer tipo de escravidão.
Mas ainda temos um segundo aspecto a ser observado neste texto. Jacó sonha um sonho acabado. Ele não sonha que Deus está tentando, lutando ferozmente contra outros deuses ou abrindo o caminho pela força. Nada disso. Também não sonha pela metade, um caminho inacabado, para que ele, Jacó, o completasse por seus próprios esforços. Não, o caminho que ele sonha leva diretamente a Deus, sem intermediários, sem desvios nem pedágios, sem alfândega nem inspetores para verificar quem pode e quem não pode andar por ele. Eu estou afirmando isso baseado no versículo 12 que diz: então sonhou: estava posta sobre a terra uma escada, cujo topo chegava ao céu; e eis que os anjos de Deus subiam e desciam por ela, por cima dela estava o Senhor.
Jacó viu anjos na escada, mas nenhum com o projeto. Não viu anjo algum com uma pá ou enxada. Muito pelo contrário, os próprios anjos estão se beneficiando da escada. Subiam e desciam por ela, e no plano mais elevado estava o Senhor. Jacó sonha com um caminho idealizado e concretizado por Deus que é tão absolutamente fantástico, que até os anjos tem prazer em estar nele.
Já os vizinhos de Jacó tentaram por diversas vezes construir uma rampa de acesso ao céu. Quem viu uma gravura da Torre de Babel sabe o que é um zigurate. Aquela construção em forma de pirâmide, cujo objetivo era chegar ao céu. Só que eles a construíam de baixo para cima, com os projetos, intenções e esforços humanos. Deu no que deu. A Torre de Babel é o atestado da incapacidade humana de querer chegar a Deus através dos seus próprios méritos e esforços. É como diz o livro do Eclesiastes: Correr atrás do vento.
É exatamente isso que o nosso povo faz, corre atrás do vento. De vez em quando aparece com uma novidade. Uma hora é a mãe Diná, outra hora é um guru indiano, logo em seguida um monge tibetano e assim vão eles de engodo em engodo. Correndo atrás de pessoas iguais a eles. Com os mesmos temores e incertezas, tão confusos, iludidos e enganados quanto eles mesmos. Crédulos na vã filosofia que afirmam que todos os caminhos levam a Deus, o dito popular foi baseado numa frase de um imperador romano que dizia que todos os caminhos levam a Roma, porque assim ele tinha construído as estradas. Estradas que eram usadas para oprimir, para roubar e para matar qualquer esperança de liberdade. Era para a opressão, para o sacrifício e para a perda que os caminhos de Roma conduziam.
É muito importante que nessa hora que tenhamos a consciência de que aquele que abriu o caminho, abriu mão também da sua divindade, e não se importou em servir de caminho, ladeira, rampa, escada, qualquer coisa para que chegássemos com alegria à presença de Deus. Sem intermediários, sem bispo aquilo, apóstolo tal, ou missionário fulano. Paulo, quando escreva a Timóteo diz isso: pois isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador, o qual deseja que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade. Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem, o qual se deu a si mesmo em resgate por todos nós. (I Tm 2,3-6).
Para finalizar, vamos abordar um terceiro e último enfoque. Jacó sonhou com um caminho, quando muitos na sua época se desesperavam na tentativa de encontrá-lo. Jacó sonhou que Deus era o autor e consumador da obra. Que Deus ele sozinho, sem ajuda de ninguém construiu o caminho, enquanto os seus contemporâneos se sacrificavam, e em meio aos seus esforços arriscavam-se por outros caminhos. O que mais faltava para Jacó? Do que mais se fazia preciso? Faltava ainda uma única coisa: a certeza de que aquilo não era apenas um sonho. Faltava que seu sonho fosse de fato verdadeiro. Faltava a Jacó a confirmação e a garantia de que não havia sonhado em vão.
Se algum vizinho aparecesse naquela hora e lhe perguntasse: Jacó, você encontrou Deus? Ele responderia: Claro que não! Era eu quem estava perdido, quem estava com medo, quem estava sem direção. Então como eu iria encontrar Deus? Ele é que me encontrou. Quando cheguei lá, naquele lugar assombrado, ele já estava. Realmente o Senhor está neste lugar; e eu não o sabia.
Chegamos então ao versículo 16 quando as dúvidas transformaram-se em certezas, o medo em confiança, a incerteza em fé, o descaminho em direção. Naquela hora que Jacó experimentou o que o esforço humano nunca poderia alcançar, o que a superstição jamais poderia supor existir, o que os rituais de êxtase nunca conseguirão vislumbrar: a paz e a segurança que um encontro real com Deus pode dar. Nesta hora Jacó se esquece de tudo, faz a entrega do que tem e do que é. Como no salmo 23, ele diz: O Senhor é o meu Pastor, e eu não preciso de mais nada. A presença de Deus podia ser sentida ali, naquele momento e não era somente um sonho. Deus estava o tempo todo ao seu lado ele não sabia. Isto se consumou naquilo que foi a grande descoberta da vida de Jacó, e que pode ser também a maior descoberta das nossas vidas: Deus está sempre ao nosso lado, mesmo que não saibamos disso.
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