Florence Nightingale (1820-1910) em ilustração do London News de 24/02/1855. |
levitas no tempo de Neemias, ficaram tão extasiados com a possibilidade de reerguer o Templo, que expressaram em uma oração toda a sua perplexidade: Bendito sejas tu Senhor nosso Deus, de eternidade em eternidade. Que se bendiga o teu santo nome que excede a toda bendição e a todos os louvores. O reconhecimento deles é tamanho que não encontram palavras. Nem mesmo as mais separadas ou as mais sagradas serviam para transmitir o excedente da bênção que eles experimentavam naquela hora.
Este é o único tipo de bendição apropriada ao nosso Deus. Não existe nada de aproveitável nos louvores subjetivos, não estamos aqui para louvar por louvar. No capítulo 29 do seu livro, Jó nos dá uma ideia do quanto é bom sentir esta bênção que lhe chegou sob a forma de bendição. Ele faz uma retrospectiva do seu passado de prosperidade e se lembra das pessoas que se levantavam para que ele sentasse, de quando se calavam quando ele passava, de como beijavam respeitosamente a sua mão. Apesar de tudo ser muito bom, nada se emparelhava à alegria da bênção dos menos afortunados. Jó encontrou uma maneira de demonstrar o quanto o rico fica feliz ao ser abençoado pelo pobre, e ele faz isso através de uma pequena mas definitiva frase: A bênção do moribundo pousava sobre mim quando eu fazia rejubilar o coração da viúva. Jó 29,13.
Mas existe ainda um terceiro e o mais forte de todos os significados da palavra bênção. Quando a palavra bênção aponta para o próprio bendito, para o bem aventurado, o abençoado ou para aquele que é o portador da bênção. Enfim, aquele que é a própria bênção. Muitos evangélicos não dão à Virgem Maria o inegável valor que lhe é devido. Em uma rápida alusão do anjo, que sempre nos passa despercebida, Maria é colocada como a detentora da expressão maior de tudo o que já se conheceu sobre bênção. Ela ouviu da boca do anjo a saudação que fazia dela este ser único e inigualável: Salve Maria, cheia de graça. Bendita és tu entre as mulheres. Uma saudação celestial que imediatamente encontrou eco entre os humanos. Sua prima Isabel também a reconheceu como tal, e foi mais além: Você é a mais abençoada dentre todas as mulheres, e a criança que você vai ter é abençoada também.
Uma bênção linda, inusitada, incontestável, mas que ninguém a quer para si. Esta bênção fez Maria ver seu Filho nascer em condições sub humanas. Fugir às pressas para o Egito. Ver que o bendito fruto do seu ventre não era mais do que o exilado político mais novo que a história conheceu. Fez com quem não entendesse a sua participação na criação de uma criança tão diferente das demais. Viu essa criança se tornar um líder controverso. Para uns era louco, para outros um beberrão. Sofreu a dor maior ao vê-lo humilhado, açoitado e pregado numa infamante cruz para morrer. Esta menina adolescente, recém saída da infância, enxerga o quão doloroso é o caminho ao qual essa bênção conduz, e ainda assim não foge ao seu chamado: Aqui está a serva do Senhor; que se cumpra em mim conforme a tua palavra.
Maria é a advertência de Deus contra a vontade de se querer bênçãos, mas também o seu ultimato contra a pretensão de se possuir ou tomar posse de bênçãos. Mais uma vez é ratificada em Maria a promessa feita a Abraão. Deus a chamou para ser, a despeito de toda a angústia que isso significava, uma bênção para todos os povos. Existe uma clara diferença entre o santo e o abençoado. O santo é aquele que anuncia a grandeza e o poder de Deus, o abençoado é o que espalha o seu amor e a sua generosidade. O santo, em nome de Deus, invoca a benção, o abençoado é aquele que é em si mesmo a resposta a esta bênção.
Quando falamos dos personagens bíblicos, parece que falamos de pessoas de outra dimensão ou de um mundo que não é o nosso. Mas nos nossos dias Deus convoca pessoas para serem bênçãos. Quem já viu um anel de enfermagem reparou na letra N gravada. Muitos pensam ser de nurse, enfermeira em inglês. Mas é nada disso. É a inicial do sobrenome de Florence Nightingale. Florence era uma moça da nobreza que orava angustiada pelos soldados que ao voltarem feridos da guerra da Criméia e morriam de infecção nos hospitais. Sua angustia durou até o dia em que se colocou à disposição de Deus para ser ela mesma resposta às orações que dirigia a Deus. Ainda que sem o conhecimento da infecção microbiológica, ela passou a cuidar daqueles soldados com extremo zelo e cuidado com a limpeza, tanto dos feridos, como dos instrumentos, como também do ambiente. Passou a proporcionar-lhes uma melhor alimentação e locais mais arejados e com ela a enfermagem moderna teve início.
Eu não sei qual é a nacionalidade de Florence Nightingale, nem qual é a sua denominação ou mesmo qual igreja que ela frequentava. Mais uma coisa eu sei. A humanidade tem uma dívida eterna de gratidão a ela, porque se o mundo de hoje tem uma enfermagem eficiente, deve á decisão daquela moça em se colocar nas mãos de Deus, para ser ela mesmo uma bênção. Florence não foi apenas uma bênção aqueles soldados, nem uma bênção restrita à sua comunidade, nem uma bênção que durou um determinado tempo. Assim como em Abraão e com Maria, Deus fez de Florence Nightingale uma bênção. Uma bênção para todas as famílias da Terra.