Eu disse: sois deuses, sois todos filhos do Altíssimo. Todavia, como homens, morrereis e, como qualquer dos príncipes, haveis de sucumbir. Salmos 82.6-7
Jael e Sisera, Artemisia Gentiles (1593-1653) |
Para estes, Deus estava abrindo, debaixo de severas condições, a possibilidade de intermediar algumas questões entre seus filhos, questões que porventura fossem capazes de julgar, porque as mais complexas deveriam seguir sempre a sua orientação divina: Dt 1,17 - Não sereis parciais no juízo, ouvireis tanto o pequeno como o grande; não temereis a face de ninguém, porque o juízo é de Deus; porém a causa que vos for demasiadamente difícil fareis vir a mim, e eu a ouvirei.
Tamanha responsabilidade fez com que esses juízes fossem chamados metaforicamente de deuses, pois, como foi dito, eles exerciam o julgamento, que era um ofício que cabia apenas a Deus. O salmo 58 é uma denúncia declarada a improbidade dos juízes em Israel que, segundo o salmista, em vez de julgarem com justiça: Longe disso; antes, no íntimo engendrais iniquidades e distribuís na terra a violência de vossas mãos. Desviam-se os ímpios desde a sua concepção; nascem e já se desencaminham, proferindo mentiras. Têm peçonha semelhante à peçonha da serpente; são como a víbora surda, que tapa os ouvidos, para não ouvir a voz dos encantadores, do mais fascinante em encantamentos.
O deuterocanônico Livro da Sabedoria diz que o julgamento de Deus sobre os magistrados e sobre os que exercem poder sobre o povo o julgamento será impiedoso, e que a sua prestação de contas no Dia do Juízo observará critérios diferenciados: Sab 6.3 - Porque é do Senhor que recebestes o poder, e é do Altíssimo que tendes o poderio; é ele que examinará vossas obras e sondará vossos pensamentos!
A denúncia contra o julgamento injusto, em que o iníquo com poder oprime o direito do pobre, do estrangeiro e da viúva é recorrente em toda a profecia bíblica. Jesus também experimentou na própria pele esse julgamento imparcial e injusto. Quando ele estava em Jerusalém por ocasião da festa da Dedicação, foi encurralado por um bom número de judeus convencidos da sua retidão e incitados por aqueles que interpretavam com julgamento próprio a Lei, escapou por pouco de ser apedrejado. Ao declarar ser o Messias prometido, comprovando através das suas boas obras, seus milagres e curas esta sua filiação divina, ainda assim foi acusado de blasfêmia, pois sendo um homem, se fazia Deus.
Foi justamente nesse ponto que Jesus comprometeu todo o julgamento que exerciam sobre ele naquela hora. Invocando o aspecto divino da responsabilidade que paira sobre o que faz julgamentos, ele simplesmente cita o início do texto do salmo 82, no qual lemos o seguinte: Eu disse: sois deuses, sois todos filhos do Altíssimo. Essa lisonja inesperada diante de uma atitude tão agressiva fez com que eles refletissem na conclusão que apresenta o mesmo salmo: Todavia, como homens, morrereis e, como qualquer dos príncipes, haveis de sucumbir.Isso foi bastante para que eles retrocedessem no seu propósito assassino.
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