Então, lhe disse Jesus: Levanta-te, toma o teu leito e anda. Imediatamente, o homem se viu curado e, tomando o leito, pôs-se a andar. E aquele dia era sábado. Leia João 5: 1-18
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Jesus sobe para Jerusalém para a comemoração de uma festa. Mas, que festa é essa? A Páscoa, a Festa dos Tabernáculos, a festa da dedicação do templo? Será que esta indeterminação é deliberada, estando a serviço de uma espécie de ironia joanina? Será que a festa a que João se refere é o próprio sábado? Por que não? O sábado é o grande horizonte do texto. Ele está no centro da narrativa. Ele é o recheio desse sanduíche de duas partes. O encontro de Jesus com o desvalido nas cercanias do poço e o seu reencontro com o desvalido no templo. Entre esse dois encontros aparece a questão do sábado.
E era dia de sábado. Esse dia era sábado. É sábado!
Qual a ironia? As lideranças censuram aquele homem por carregar o leito, mas não reagem diante do fato da cura propriamente dita. Nos sinóticos, todos ficam maravilhados. Aqui não, ignora-se o milagre, o miraculum, o maravilhoso. Aqui a presença da luz não provoca admiração, admiraculum, espanto, abertura ao maravilhoso, ao sublime. Então eles dizem: Ele curou no sábado! Amarrados por uma compreensão literal, legalista, apequenada do princípio judaico do shabatt. É como se João dissesse: É sábado!!! Dando a entender que tal expressão revela não apenas a liberdade de Jesus diante da lei e da tradição, mas revela também a ideia do sábado como plenitude da criação, a plenitude de toda busca humana, o espetáculo maravilhoso da presença de divina em tudo e em todos.
A expressão é sábado! Aparece entre duas menções à saúde recuperada, a shalom recuperada, a sanidade recuperada. E conforme a expectativa judaica a cura dos enfermos é um sinal antecipatório da chegada do tempo da salvação plena. Vejamos, por exemplo, o texto de Isaías 35: 4-6: Então, se abrirão os olhos dos cegos, e se desimpedirão os ouvidos dos surdos; os coxos saltarão como cervos, e a língua dos mudos cantará; pois águas arrebentarão no deserto, e ribeiros, no ermo.
Corroborando com essa afirmação do sábado está a palavra de Jesus: O meu Pai trabalha até agora e eu também trabalho. Ou seja, Jesus situa o milagre de Betesda no contexto do agir divino que quer levar a criação ao seu supremo acabamento. A ironia de João está, pois, em que os as lideranças religiosas repetem: É sábado, é sábado! Como pode acontecer isso? É como se Jesus dissesse: É sábado!!! É o tempo próprio para isso! Sábado: o mundo como poderia ser não fosse a alienação a que está submetido. O mundo como poderia ser não fossem homens e mulheres e sistemas enfeitizados pela ganância, pelo egoísmo, pelo materialismo barato, que nos impede a elevação de nós mesmos. (continua)
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